domingo, 10 de outubro de 2010

Família em análise

    Durante entes dias que se passaram, semana santa em nosso calendário, tive a oportunidade de estar com minha família, pelo menos uma parte dela, no francês em Marechal Deodoro cidade do berço materno, e de forma que o tempo ia passando mais eu me via instigada a observar e de alguma forma inferir sobre determinadas relações que ali se estabeleciam, e de alguma forma perceber a relevância das mesmas tanto para mim como pessoa e profissional, quanto como amiga e serva de um Deus real, que a todo tempo em sua palavra desenvolve temas referentes às questões humanas, sociais como um todo e familiares.

Não sei por onde começar, mas escolho partir de uma reflexão sobre o papel da querida “vovó” (entende-se aqui também vovô, este já falecido) em toda a dinâmica das relações familiares decorrentes. Bem rodeada de pessoas minha avó é uma pessoa amável que ama os “netinhos” e sente-se extremamente bem em prestar-lhes serviços. O interessante é que de fato o significado de utilidade, de valor que ela tem de si mesma é apenas referente a promoção de meios materiais aos seus, desde ações manuais ou não até disponibilização de “verbas” ( gargalhada).
Em um dos dias, se eu não me engano na manha do sábado, vovó estava toda chorosa falando como sempre das suas dificuldades de como é ruim ser velho, falava da sua visão comprometida a qual não poderia mais ser feita operação para reverter o quadro, de que não podia mais viver sozinha, de que nem mais cozinhar ela conseguia, queimando panela esquecendo as coisas, em sua fala: “para você vê como é cabeça da gente”, ela mostra que entende a relação dessas coisas com a falta de memória. Também resmungava por não poder mais fazer seus trabalhos domésticos, de trombar nas coisas e ate cair, eu e minha irmã tentávamos mostrar-lhe a necessidade de ser agradecida da existência de outros idosos em situações piores e da possibilidade de ser feliz ainda que sofrendo desses males da velhice. Parecia que era mesmo que nada nossas palavras pareciam pó que se esvair no ar cada vez que vovó tinha uma oportunidade de fala. Pensando bem por que ela ouviria duas “piralhas” repetindo as mesmas conversas de suas mães, conversa esta que talvez um dia ela mesma tenha dito para seus filhos. E hoje eu entendo o que ela quis dizer quando disse: só quem é velho é que sabe minha mãe bem que dizia... Eu duvido alguém conseguir viver assim. Viver no sentido de felicidade de bem estar, infiro eu.
Eu continuei tentando explicar a ela de forma simples que era possível ser feliz em meio a circunstancias adversas, eu e minha irmã novamente colocamos para ela a historia de uma senhora lá da nossa igreja bem velhinha que não anda nem mais direito e que todo culto vai com o auxilio dos braços de seus filhos e até mesmo faz questão de ficar em pé e louvar a Deus nos momentos de louvores. Minha avó não demonstrar de formar evidente em suas expressões faciais e fala nenhum ar de desprezo como forma de superioridade, mas estes indícios escapam de forma bem sutil em palavras e atitudes. Me apercebendo disso lhe propus que mesmo os mais novos e inexperientes tinhas coisas a ensinar aos mais velhos e as coisas que mesmo sendo mais nova e não sendo velha e sofrendo seus sofrimentos o que eu dizia também eram coisas relevantes, mas como lhe convinha fazer ela prosseguia seu relato pessimista como se não ouvisse minhas palavras daquele momentos como também perguntas posteriores feitas a ela, simplesmente não esboçava sinal nenhum de entendimento negação ou afirmação, apenas continuava a falar. Nesse momento agora propunha a eu ouvi-la, já que ela não se propunha a tanto...
Outros pontos interessantes se encontram na interferência da minha tia Lucy na conversas apontando as controvérsias no discurso ideário da vovó. Apontando seus “chiliques” e escândalos nas casas de outros tios, desde interferindo em discussões da família ate para voltar para sua casa. Até mesmo quando a vovó falava que não entendia por que certas coisa aconteciam (brigas com filhos, entre irmãos que no caso eram filhos dela) tia Lucy indagava : “até parece que isso não acontecia com a senhora”. E quando falou da falta que o vovô fez para ela ainda minha tia rebatia: “na morte NE? Por que em vida era um pega pa capa”. Assim percebe-se como a contradição nos discurssos familiares é extensíssima, estando sempre presente na forma como os sujeitos resignificam suas experiências do passado. No caso da vovó as colocava como o seu ideário, falando do presente em termos de males e do passado como o tempo bom que se foi, e principalmente da não existência de um futuro pois o presente já não faz mais sentido.
A partir desta conversa a todo tempo passei a refletir sobre essas relações familiares envolvendo a minha avó, mesmo aquelas em que ela aparentemente não se presentificasse. No dia seguinte reunido em volta da mesa eu , minha irmã e seu namorado , minha prima Laís e a tia Lucila. O tema era desorganização, claro das filhas, e a intolerância dos pais. Sem entrar em detalhes discutíamos a falta de harmonia nas famílias por conta dessas condições de desorganização, a incapacidade dos pais de verem seus papeis em quanto tais além da simples tarefa disciplinadora, corretora, ou seja, estávamos questionando a redução das relações familiares as relações materiais da família, excluindo assim as afetivas e emocionais que eram desprezadas em prol de reclamações constantes e a falta de demonstrações de carinho e amor. Sendo apenas as reclamações a forma mais prazerosas para um dos lados de manter um dialogo neste caso com nós filhas( Bela, Lize, Laís).
Elas afirmam negativamente, mas entendo que por não terem os meios, no sentido de ter um arcaboço prático em suas histórias de vida, de manter outro tipo de relacionamento com os filhos o estabelecem em cima do conflito relativo ao material disponibilizado, isto é, a única forma de obter a atenção dos mesmos e de desenvolverem sua paternidade-maternidade.
Com isso percebo que a ênfase nessas relações materiais esta presente em toda minha estrutura familiar, desde a vovó até nossos pais que ao superarem inúmeras dificuldades de suas famílias reproduziram outras, apenas com um conteúdo e contexto diferente.   Pois da mesma forma que a vovó hoje sente sua inutilidade em termos da não potencialidade para o trabalho para a atividade, para supri necessidades financeiras, vê perdida sua autonomia e autoridade e não consegue conviver com essas perdas, da mesmas forma pais e tios replicam uma ênfase absurda em termos da materialidade supridora como responsabilidade dos pais bem como um autoridade sobre o andamento da casa. Vovó também demonstra indícios não apenas de busca por autonomia ( no querer ou não de fazer algo que lhe é requerido) mas também de uma autoridade simbólica de querer asperamente permanecer em sua casa( como afirma ela : “assim como meus pais”) e não de ir morar com seus filhos mas que algum deles vá morar com ela em sua “própria” casa, assim ela tenta preservar essa autoridade posta em chefe por suas debilidades físicas.


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