domingo, 17 de agosto de 2014

metamorfose

O meu coração se apertou e por alguns instantes já não o sentia mais em meu corpo. Peguei-me olhando pra trás como quem admira uma pintura. Esta deitava seus traços numa bela moldura de mogno trabalhado que ocupava o campo esquerdo de uma parede branco gelo no fim de uma sala retangular comprida e vazia. Nela havia tantos espaços desocupados que a pintura mesmo opaca sem cores vivas e radiantes podia tomar para si, sem esforço algum todos os olhares, embora naquele momento só os meus olhos a contemplassem.
Em meu campo visual periférico percebia uma lareira daquelas dos filmes, mas que de onde eu vinha não eram comum; comum mesmo era o calor de dia e de noite. Definitivamente não precisávamos de lareiras, mesmo que fosse pra que um lobo ou um papai Noel descesse por ela.
Mais ou menos a minha frente havia uma mesa redonda de vidro amarelado e a base de madeira sobre a qual um jarro fino com uma flor de cor azul repousava.
Meus olhos, ainda que analisassem os espaços ao redor, tinham seu foco na pintura com medidas destoantes e traços disfórmicos e, mesmo que os fechasse poderia senti-la com todos aqueles detalhes mais sutis. Eu nunca havia pintado uma tela na vida, mas de alguma forma esta estava latente em minha memória como parte de mim.
Continuei a admirá-la sem pressa, absorta em análises, pensamentos e sensações, podia notar altos e baixos quase imperceptíveis a olhares desatentos, podia até mesmo sentir seu cheiro de pigmentos e matizes à base de óleo, bem como todo seu abandono, perdida naquele espaço vertiginoso.
Então vi meu corpo desfazer-se, aquela imagem e eu já não eram dois corpos e me dei conta da proximidade do meu corpo àquele turbilhão pulsante de tons e nuances. Suas instabilidades me atraiam envolvia-me num observar cada vez mais compreensivo. Aquele entrelaçar de gente e arte parecia dar um sentido único aquilo que parecia apenas uma pintura numa sala qualquer. Era eu. Ali... desnuda, feita em arte, em cores e formas. Então acordei ...  E já não era apenas uma tela sem graça , mas uma obra em criação.

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